Caso
quente
Calça de advogado pega
fogo em alegações
finais de ação sobre
crime de incêndio
12 de março
de 2017, 8h36
Por João
Ozorio de Melo
Durante todo o
julgamento de seu cliente, acusado
de colocar fogo no próprio
carro, em Miami, o advogado Stephen
Gutierrez, 28, fez uma defesa
ardente. Ele sustentou a tese
de que combustões espontâneas
ocorrem e que esse foi o caso
do carro destruído.
Logo depois de
iniciar suas alegações
finais, em frente aos jurados,
Gutierrez começou a mexer
nervosamente no bolso direito
de sua calça. Mais alguns
segundos e a calça começou
a exalar fumaça. Gutierrez
correu da sala de julgamento para
o banheiro mais próximo.
Houve um momento
de confusão da sala de
julgamento e o juiz Michael Hanzman
mandou os jurados se retirarem.
Pouco depois, Gutierrez voltou,
um tanto assustado, mas sem ferimentos.
Apenas seu bolso direito estava
parcialmente queimado.
O advogado explicou
ao juiz que, quando falava para
o júri, sentiu alguma coisa
quente em sua perna. Por isso
teria enfiado a mão no
bolso. No final das contas, disse
ele, uma bateria defeituosa de
seu cigarro eletrônico que
pegou fogo. E quando chegou ao
banheiro, jogou a bateria na água.
Na verdade, disse ele, três
baterias estavam em seu bolso.
O juiz, o promotor
e demais pessoas na sala pareceram
não estar convencidos,
de acordo com o jornal Miami Herald,
a emissora de TV ABC News e o
Jornal da ABA (American Bar Association).
A dúvida
é se houve uma grande coincidência,
pelo fato de a calça do
advogado pegar fogo sem que alguém
o provocasse (justamente a tese
que ele defendia), ou uma grande
armação do advogado
para demonstrar sua tese de incêndio
espontâneo.
O juiz ficou,
inicialmente, com a segunda hipótese:
“Me parece muita coincidência
que, quando você está
em um caso envolvendo crime de
incêndio, em que você
está tentando persuadir
o júri de que houve alguma
espécie de combustão
instantânea em um veículo,
e, enquanto está apresentando
suas alegações finais
aos jurados, de repente alguma
bateria em seu bolso se torna
inflamável”, ele
disse.
“Eu juro
por minha vida que não
foi um truque”, disse Gutierrez
ao juiz. “Não pretendi,
de forma alguma, fazer uma demonstração
teatral de que combustões
espontâneas podem ocorrer.
O problema foi causado pela bateria
defeituosa”, ele declarou.
Na verdade, existe
o risco de baterias de cigarros
eletrônicos (e-cigarettes)
explodirem. Eles produzem nicotina
vaporizada através de uma
solução líquida
aquecida. Por isso, o Departamento
de Transporte dos EUA proibiu,
recentemente, carregar cigarros
eletrônicos em malas, bolsas
ou de qualquer outra forma em
aviões.
O promotor pediu
ao juiz que punisse o advogado
por desrespeito ao tribunal, o
que pode lhe render, por exemplo,
uma noite na prisão. Mas
o juiz pediu um prazo para pensar
no caso – com a cabeça
fria. Policiais e promotores de
Miami recolheram as baterias para
investigar o caso.
No final das contas,
o cliente de Gutierrez foi condenado
por crime de incêndio. Consultado
pelo Jornal da ABA, o advogado
criminalista Marcos Beaton Jr,
também de Miami, disse
que o réu poderá
usar o incidente para entrar com
recurso contra a condenação
ou para pedir a anulação
do julgamento.
“Tanto faz
se foi uma coincidência
infeliz ou um tiro que saiu pela
culatra (se foi armação
do advogado para persuadir os
jurados), o fato é que
o réu foi prejudicado pelo
incidente. Ele pode alegar que
não teve um julgamento
justo”, disse.
João Ozorio
de Melo é correspondente
da revista Consultor Jurídico
nos Estados Unidos.
Revista Consultor
Jurídico, 12 de março
de 2017, 8h36
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