Sem
autocontrole
Vício em drogas retira dolo
de faltas cometidas no trabalho, decide
TRT de Minas
22
de julho de 2016, 13h00
Trabalhador
que comete infrações
por causa do vício em crack
não pode ser punido, já
que a droga faz com que seu usuário
perca a capacidade de discernimento
e autocontrole. Por isso, a 8ª
Vara do Tribunal Regional do Trabalho
da 3ª Região, em Minas
Gerais, confirmou sentença
que anulou demissão por justa
causa de funcionário da Copasa
dependente de álcool e crack.
O
trabalhador era acusado de ter se
ausentado sem prévio aviso,
dirigir veículo sem ter credenciamento,
furtar uma motocicleta da empresa
e furtar hidrômetros da empresa
em três ocasiões. Ele
confessou os furtos, apontando, no
entanto, que estaria sob efeito de
drogas quando tudo ocorreu.
Embora
reprovando os furtos praticados pelo
agente de saneamento, o relator, o
juiz convocado Rodrigo Ribeiro Bueno,
considerou que o empregado não
poderia ser dispensado, por se encontrar
incapaz de entender a ilicitude do
fato. "O empregado estava premido
da necessidade de apropriar-se de
algum objeto patrimonial para que
pudesse vendê-lo e assim conseguir
dinheiro para saciar o vício
físico-químico",
registrou no voto.
Para
o julgador, não se pode admitir
que a penalidade máxima existente
no Direito do Trabalho seja utilizada
para punir um empregado com doença
crônica grave como é
o vício em drogas. Ele não
identificou o dolo e a culpa no caso,
ponderando que o crack retira do usuário
a capacidade de discernimento e de
autocontrole. Também ressaltou
que o agente de saneamento poderá
ter direito a aposentadoria por invalidez,
caso não haja recuperação
para a doença.
"Não
se poderia validar a dispensa tal
qual perpetrada, deixando esse empregado,
neste momento de extrema vulnerabilidade
e que mais necessita de apoio familiar
e social, à margem de sua própria
sorte", disse Bueno, apontando
que a dispensa do empregado doente
também afronta aos princípios
constitucionais da dignidade da pessoa
humana, do valor social do trabalho,
da função social da
empresa e da proteção
da saúde.
Jurisprudência
da área
A decisão também se
referiu a jurisprudência no
sentido de vedar a dispensa do empregado
que sofre de alcoolismo crônico.
Segundo Bueno, a justificativa é
que o empregado que sofre de alcoolismo
crônico deve ser encaminhado
para tratamento e receber da empresa
o apoio necessário para sua
recuperação. O alcoólatra
não pode ser dispensado em
razão da compulsão que
o impele a consumir descontroladamente
a substância psicoativa responsável
por retirar-lhe a capacidade de discernimento
sobre seus atos.
Para
o juiz, a mesma situação
se verifica quanto à dependência
física de outras drogas que
incapacitem o trabalhador para suas
atividades. Como exemplos, foram citados
a maconha, cocaína e o crack,
pois também são tratados
pela medicina como doença,
em razão da síndrome
de abstinência.
"Ao
invés de optar pela rescisão
do contrato, competia à empregadora,
seja por motivos humanitários,
seja pela função social
da empresa, afastá-lo do trabalho
a fim de proporcionar-lhe tratamento
médico, e até encaminhá-lo
ao INSS para eventual recebimento
de benefício previdenciário
caso entendesse que a patologia era
insusceptível de recuperação",
ponderou o juiz.
Quadro
conhecido
O quadro de dependência de álcool
e crack era de conhecimento da empresa.
Ela chegou a inscrever o trabalhador
no Programa de Prevenção
e Atendimento ao Sujeito em relação
ao Álcool e às Drogas
(PASA), em 2010. Assim, houve tentativa
de encaminhamento para tratamento
em clínicas conveniadas, mas
sem sucesso. Um relatório apresentado
revelou que o trabalhador não
possuía motivação
para mudança de comportamento,
nem disponibilidade para abstinência
de consumo de substâncias psicoativas,
mesmo depois de diversas internações
em clínicas especializadas.
Em abril de 2013, a comissão
do PASA desistiu do tratamento por
entender que o prognóstico
do empregado era desfavorável
à recuperação.
Para
o juiz, a empresa não poderia
ter desistido. "Em se tratando
de patologia crônica, a reclamada
não deveria ter desistido do
trabalhador tão rapidamente,
sem antes optar por afastá-lo
do trabalho, continuando o tratamento
médico iniciado, mas interrompido
em 2013, e até encaminhá-lo
ao INSS para tratamento mais efetivo
e eventual recebimento de benefício
previdenciário", ressaltou
no voto. Com informações
da Assessoria de Imprensa do TRT-3.
Revista Consultor Jurídico,
22 de julho de 2016, 13h00